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Ponto e vírgula

  • Foto do escritor: Paulo Ferreira
    Paulo Ferreira
  • 30 de nov. de 2017
  • 2 min de leitura

Quando me perguntam a profissão e eu respondo “documentalista”, antes que me imaginem de luvas calçadas, com o nariz enfiado em livros antigos e a catalogar documentos, eu adianto-me e esclareço que o meu mister é outro.

Pesquiso imagens, faço tratamento gráfico, fotografo, etc. Em vez de rato de biblioteca, sou um hamster de pixéis, mas os livros, esses continuam a fazer parte da minha vida.

Consulto regularmente manuais técnicos e escolares, leio imenso banda desenhada, revistas, novelas de ficção científica... Por conseguinte, quando vejo livros à sombra de caixotes de lixo, dói-me a alma! Alguns são salvos e encontram refúgio na minha casa, outros estão tão irremediavelmente perdidos que só lhes resta o golpe de misericórdia: o ecoponto azul.

Um destes “resgates” teve lugar em pleno Parque Natural Sintra Cascais. Quem tem o hábito de caminhar pelo campo, sabe que entre árvores e arbustos há quem semeie sacos de lixo, sanitas escaqueiradas, colchões, mobílias velhas, etc. Outro tipo de espécies invasoras.

Mal tinha começado a caminhada, já não me recordo do percurso, quando vejo uma pilha de livros, revistas e mobílias. Ao remexer aquele amontoado com o bastão de caminhada, descubro um livro com aspeto bastante antigo. Apanhei-o com “luvas de pelica” porque na noite anterior havia chovido copiosamente e tive medo que ele se desfizesse nas minhas mãos.

Ao chegar a casa, depositei-o num sítio seco e com pouca exposição solar. Coloquei uma folha de papel higiénico entre cada página de forma a absorver o excesso de humidade e volvidas duas a três horas, substituí as folhas molhadas por outras secas. No primeiro dia devo ter usado um rolo inteiro neste processo. Nos dias seguintes, à medida que a humidade desaparecia, só “mudava a fralda” à noite.

O resultado está à vista - Algumas extremidades da lombada esboroaram, a maioria das páginas apresenta machas – que não comprometem a leitura – e que provavelmente já lá estavam devido à acidez do papel.

Não ficou com a melhor das apresentações, mas dadas as condições em que o encontrei e a antiguidade da obra, sinto-me satisfeito com o restauro.

O livro em causa é “Vida, e vinda dos Stos. Trez Reys Magos, advogados dos caminhantes”, pelo padre Pedro Correa, impresso na oficina de Miguel Manescal da Costa, impressor do Santo Ofício, no ano MDCCXLV... 1745.

Este livro “viveu e sobreviveu” ao terramoto de 1755, para ser deitado no lixo e à chuva! Não foi salvo por intervenção divina, mas foi um documentalista caminheiro que ajudou este advogado dos caminhantes.

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